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2019-08-26 - Corneta do Agro, Cana de Açúcar

Será mesmo que o "uso da palha da cana para produzir etanol gera risco ao meio ambiente"?

A reportagem abaixo foi publicada no Portal G1 e recompartilhada em diversos outros portais som o título "USO DA PALHA DA CANA PARA PRODUZIR ETANOL GERA RISCO AO MEIO AMBIENTE, DIZ PESQUISA", leia a reportagem e depois veja o comentário do Dr. Roberto Fioretto.

Um pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) alerta que o uso da palha da cana-de-açúcar para produzir de etanol a energia elétrica sustentável, prática usada por algumas usinas, pode deixar o solo infértil e gerar danos ao meio ambiente. Segundo a pesquisa, a palha serve como uma camada protetora do solo e, sem os nutrientes oferecidos por ela, será preciso dobrar o uso de fertilizantes até as próximas décadas para repor o que foi retirado do meio ambiente.

O estudo desenvolvido pelo professor da Universidade de São Paulo (USP) em Piracicaba (SP) Maurício Cherubin busca identificar os principais impactos a longo prazo da colheita irregular do material usado na produção da bioenergia – a energia obtida em matéria orgânica animal ou vegetal. Além disso, a pesquisa quer alertar as usinas sobre a quantidade mínima de folha a ser deixada no solo. “A retirada como vem acontecendo em alguns locais já é algo preocupante”, afirma o pesquisador ao G1.

O especialista explica que muitas usinas já se preocupam com o manejo da palha, mas que, se o ritmo de retirada do material do meio ambiente continuar excessivo, será necessário dobrar o uso de fertilizantes até 2050 para suprir a demanda de nutrientes que a lavoura precisa. Caso contrário, a fertilidade do solo tende a diminuir.

Produção

Com a palha, é possível produzir energia elétrica mais limpa, utilizada em usinas e em redes de distribuição, além do etanol celulósico – conhecido como "etanol de segunda geração". De acordo com Cherubin, o uso do resíduo nas usinas é sustentável porque há redução na emissão de combustíveis fósseis, por exemplo.

“As usinas usam a palha porque não há aumento de área de cultivo, e sim um aproveitamento de um resíduo que ficaria ali no solo. Com isso é possível desenvolver uma energia limpa, sustentável, e baratear custos de produção”.

"Essa utilização é uma boa oportunidade para o país, mas é preciso tomar cuidado para trazer benefícios tanto à indústria como ao campo”, acrescenta o engenheiro agrônomo.

O estudo publicado no começo de agosto na revista científica Bioenergy Research teve participação também de outros pesquisadores da Esalq, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) e do Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP).

Importância da palha

Apesar de a palha ser, basicamente, a folha da cana que fica no solo após a colheita da cultura – e muitas vezes foco dos incêndios criminosos – o professor da USP explica que esta matéria orgânica fornece nutrientes que a terra precisa para ser fértil, como potássio, nitrogênio e fósforo, além de servir como uma camada protetora contra erosões.

Além disso, de acordo com Cherubin, a folha da cana ajuda no “sequestro” de carbono, nome dado ao processo em que o gás carbônico absorvido pelas plantas durante a fotossíntese fica "retido" no solo, reduzindo o avanço do efeito estufa.

"Durante os estudos, percebemos que há áreas onde a retirada da palha em excesso já é algo preocupante. Os impactos vão começar a ser sentidos de forma gradativa", afirma o pesquisador.

As conclusões do estudo foram obtidas a partir do cruzamento de dados levantados em experimentos de campo feitos em duas cidades e outras informações já disponíveis no campo acadêmico. Com isso, a pesquisa sugere que a média de palha que deveria ser deixada na natureza varia entre sete e dez toneladas por hectare, dependendo da qualidade do solo.

“Vai ter áreas que produzem muito mais que isso, então não há problemas. Mas há solos que já produzem essa quantidade mínima, onde não deveria ser mexido”, pondera o engenheiro.

Mais fertilizantes, mais impactos

A avaliação de que será necessário dobrar o uso de fertilizantes até 2050 para suprir a demanda de nutrientes que o solo exige desconsidera o aumento natural no uso do adubo por causa do crescimento de áreas de cultivo da cana-de-açúcar. Segundo Cherubin, o fertilizante proporciona uma série de benefícios à cultura, mas é preciso evitar excessos.

“Quando aplicado [o fertilizante] em excesso, ele causa uma série de problemas. É como se fosse a diferença entre o remédio e o veneno”, compara Cherubin.

O engenheiro explica que os fertilizantes fornecem os mesmos nutrientes que a palha, mas a diferença é que são solúveis, ou seja, acabam escorrendo com mais facilidade durante chuvas – principalmente se o solo já está com alguma erosão – indo para rios e causando até mortandade de peixes. Além disso, parte do nitrogênio do fertilizante vai para a atmosfera durante a aplicação na cana, situação que polui o ar.

"Podemos ter a contaminação das águas e, em casos mais extremos, a eutrofização, que aumenta a carga de nutrientes e faz crescer plantas aquáticas, tirando o oxigênio das águas", explica.

De acordo com a pesquisa, os impactos também serão sentidos no bolso dos produtores e da própria indústria, que terá de desembolsar mais dinheiro para a compra de fertilizantes. "Sempre tentamos uma relação balanceada entre os benefícios para a indústria e produção da energia renovável", finaliza Cherubin.

Nosso comentário

Sem dúvida alguma, a falta da reciclagem de material vegetal ao solo, pode contribuir para provocar um desequilíbrio sustentável da produção agrícola nas áreas sem a reciclagem dos resíduos da colheita (palhada), mas convenhamos, não precisa ser tão sensacionalista assim, de acordo com o título da matéria!

É por essa razão que defendemos uma Agronomia de Diagnóstico ao invés de uma Agronomia de Protocolo. Nesta última, não há parâmetros para a tomada de decisões, simplesmente, cumpre-se os protocolos de manejo (calagem; adubação; plantio; adubação de cobertura; aplicações de resíduos industriais; plantas de cobertura; etc.). Já na Agronomia de Diagnóstico, as tomadas de decisões são feitas com base em análises diagnósticas, para então executar as ações, de manejo, que atingirão um objetivo almejado. Um exemplo disso pode ser verificado com o elemento potássio (K+), o qual é quase que totalmente solúvel dos tecidos da palhada.

A água da chuva que cai sobre o colchão da palhada, arrasta e/ou lixívia o potássio para a solução do solo, represando-o na camada superficial (fenômeno conhecido como bombeamento do potássio). Esse teor acumulado, que antes estava diluído num volume de solo (cmolc/dm3) explorado pelas raízes, agora, pelo efeito da absorção (demanda nutricional ou bombeamento), é despejado numa só camada, impactando negativamente na fertilidade do solo, como:

  • Indução de deficiência de magnésio;
  • Dispersão de argila;
  • Provocando compactação superficial;
  • Aumento da salinidade da solução;
  • Diminuição da água disponível.

Vale ressaltar que, enquanto a soja suporta salinidade da solução do solo, da ordem de CEes = 5.000 µS/cm, a cana-de-açúcar não sobrevive com salinidade da solução acima de CEes = 1.700 µS/cm.

Outro exemplo, pode ser citado, quando se produz cana-de-açúcar em solo arenoso (teor de Argila<40%), onde o bombeamento do potássio e, posterior redistribuição no perfil, causando um gradiente de concentração da superfície para camadas mais profundas, pode provocar a dispersão das argilas, aumentando o teor de Argila Dispersa em Água (ADA), resultando em compactação superficial, com reflexos diretos na diminuição da água disponível e, redução na absorção de nutrientes. Portanto, nessas áreas, o uso de nutrientes monovalentes catiônicos, como o potássio, tem que ser monitorado ou até, suprimido momentaneamente, para evitar esse fenômeno.

Portanto, o diagnóstico de uma situação atual, é que determina a conduta de manejo, para se atingir uma situação ideal, ou seja, se deve ou não continuar com a tal prática.

Obs: Os resultados de anos de conduta com uma Agronomia de protocolos, têm nos levado às consequências que estão aí, às nossas vistas, ou seja, perda da fertilidade dos solos, com impacto direto na produtividade agrícola e, culminado em recuperações judiciais.

“Errar é permissível, mas persistir no erro é.....”.

  Quer saber mais sobre esse tema? Confira no livro do Dr. Roberto Fioretto e Me. Conrado Fioretto: PALHADA DA CANA-DE-AÇÚCAR – Possibilidades e Limitações Agronômicas em Solo Tropical